A comunicação assíncrona é um dos elementos essenciais para que as equipas trabalhem em formato à distância. Parte do sucesso do trabalho em equipa em ambiente de teletrabalho passa por cultivar hábitos de comunicação assíncrona.
Admito que não é natural ter de esperar duas ou três horas por uma resposta no slack ou noutro canal semelhante, sobretudo quando estamos habituados a ter os colegas de trabalho no gabinete do lado, à mão de semear. Não estamos habituados.
Podem as boas práticas da comunicação assíncrona contribuir para o desenvolvimento do trabalho em equipa e, em última instância, para a cultura da empresa? Defendo que sim e irei procurar apresentar as razões nos próximos pontos. Para já, explico o que entendo por comunicação assíncrona e o que a distingue da síncrona.
Comunicação assíncrona – o que é?
Na comunicação assíncrona os intervenientes não estão disponíveis no mesmo momento para perguntar ou responder. É enviar uma mensagem no slack para a equipa com quem trabalho às 8h da manhã e saber que eles irão responder durante o dia, no seu tempo – ou até no dia seguinte. Neste tipo de comunicação é importante cultivar duas atitudes: o respeito pelo tempo do outro (o tempo de trabalho e o tempo da pausa) e a calma para esperar por uma resposta.
A comunicação assíncrona não é uma novidade do teletrabalho: o e-mail talvez seja a ferramenta que mais utilizamos e que enquadra neste registo assíncrono. Quando envio um e-mail ao Jorge Oliveira para fazer um ponto de situação sobre os artigos aqui do Journal, espero que o Jorge responda quando lhe for possível – e não nos minutos seguintes ao envio do e-mail. No seu tempo, o Jorge dará resposta.
Se eu precisar de um momento de toró de ideias (ou brainstorming) talvez seja mais eficaz marcar uma reunião rápida com o Jorge de forma a que seja possível a ambos estar online, de forma síncrona, ao mesmo tempo, para bater bolas. Mas até o brainstorming pode ser feito de forma assíncrona – tudo depende um pouco da urgência do assunto e da prioridade que lhe queremos dar no nosso dia de trabalho.
Exemplos de comunicação assíncrona
Para que a comunicação assíncrona funcione ajuda muito adoptar uma linguagem directa e assertiva. Imagine que o slack é o seu canal de comunicação em equipa. Se pretende marcar uma reunião com a Mariana, envie uma mensagem à Mariana com uma proposta clara de dia e hora (ou duas alternativas). Exemplo:
Olá, Mariana. Preciso de falar contigo sobre o tópico Y. Poderias reunir comigo, via zoom, no dia 28 de junho, às 16h?
Adiantar informação sobre o motivo do contacto poupa tempo, energia e também diminui a ansiedade. Já pensou nos inúmeros “olá, tudo bem?” que ficam pendurados à espera de resposta e que na verdade não são perguntas sobre o nosso estado emocional, mas uma forma de captar a nossa atenção. Outros exemplos podem ser encontrados nesta publicação da plataforma Contente.vc.
A comunicação assíncrona exige planeamento, uma espécie de visão de helicóptero e ao mesmo tempo atenção aos detalhes: é preciso antecipar algumas alternativas e até eventuais respostas. No início dá algum trabalho, sobretudo na fase de estabelecimento de regras de utilização dos canais. É fundamental não dispersar para que não se perca tempo em busca de informação ou se incomode as outras pessoas da equipa com perguntas cujas respostas estão no slack – ou será num audio do whatsapp? hum?
A importância das regras de utilização dos canais de comunicação
É importante estabelecer quais os canais de comunicação a utilizar e para que fins. Posso usar o e-mail para assuntos mais longos, recorrer a um Google doc para criar um texto colaborativo, definir o slack como ponto de encontro da equipa com canais específicos (por projecto, por exemplo – não esquecer um canal só para partilha de disparates, por exemplo).
Estabelecer horários e formas de comunicar nesses canais (registo escrito ou audio, por exemplo) é uma regra de ouro para a comunicação assíncrona. Desta forma podemos gerir a nossa capacidade de resposta e também permitir à outra pessoa uma melhor gestão de expectativa de resposta.
Por exemplo, na minha assinatura de e-mail consta a seguinte informação:
“para que possa gerir a sua expectativa de resposta: por norma, respondo aos e-mails de segunda a quinta, entre as 10h e as 18h.“
Se o assunto for urgente, há outro canal além do e-mail para fazer o contacto. Ah, e é importante definirmos o que entendemos por urgente, pois há pessoas para quem tudo é urgente e “vai-se a ver” nada é verdadeiramente urgente.
Pessoalmente tenho duas regras que muito estimo: procuro não dar o número de telefone para evitar as chamadas “urgentes” e, ao mesmo tempo, evitar contactos via sms ou whatsapp. Motivo? No caso do whatsapp creio que existe a ilusão de que as pessoas estão no aplicativo com toda a disponibilidade do mundo e a todo o momento, sem horários de resposta.
Vulgarizou-se a prática do responder rápido e a todo o momento, e que isso é sinal de “sim, senhor, eis uma pessoa trabalhadora”. Só. Que. Não. É só uma pessoa que responde rápido e que por vezes nem sabe bem ao que está a responder, a quem pode faltar contexto, com maior possibilidades de se enganar.
Quando a nossa equipa tem uma comunicação assíncrona afinada e estruturada, os momentos de comunicação síncrona tornam-se muito mais significativos: podemos combinar 10 minutos para tomar café, seja no bar ou no zoom. Nesses 10 minutos falamos sem agenda estabelecida, aproveitando o tempo para uma fofoca ☺️ ou para partilhar uma ideia.
Vou repetir-me: o planeamento é fundamental – a este propósito convido-o/a a revisitar este artigo sobre estudo que tem sugestões preciosas de planeamento que não se aplicam somente ao estudo, mas também ao desenvolvimento do nosso trabalho.
Ter tempo livre não significa disponibilidade
Num dos últimos episódios do podcast Casa Trabalho Casa, a Ana e a Rute recordam que o nosso cérebro precisa de tempo para mudar de tarefas. Esta é uma das razões pelas quais é tão importante gerir o tempo, salvaguardando tempo para o tempo livre.
Aproveito para partilhar a minha experiência, da qual decorre o tweet que partilho acima. Durante o meu tempo livre, a pessoa que está a ler este artigo (a quem vamos chamar de Ludovico) pode encontrar-me a fazer tweets, em vez de estar a responder ao e-mail que o Ludovico me enviou. Não vai servir de muito ao Ludovico enviar-me uma DM a dizer que enviou um e-mail, pois eu só vou responder quando o meu tempo livre terminar e quando chegar a sua vez.
Quando trabalhamos em equipa é fundamental ser transparente no que diz respeito aos canais de comunicação a usar, aos tempos de resposta – e também quanto à nossa disponibilidade. Respeite as suas pausas e dê a entender às pessoas com quem trabalha que essas pausas são preciosas.
Joana Rita Sousa, Entre a pressão e a produtividade: a pausa
O Ludovico tem de aprender a respeitar o meu tempo e eu tenho de aprender a respeitar o tempo do Ludovico. Respeitamo-nos mutuamente. Todos ficam a ganhar. Na comunicação assíncrona ou síncrona a clareza e a simplicidade são ferramentas que fazem toda a diferença. Fica apenas um aviso: a clareza e a simplicidade exigem treino constante. Por isso, qualquer momento de interacção com a sua equipa pode ser um bom momento para a prática.
Em suma: a comunicação assíncrona exige planeamento e atenção ao detalhe, bem como duas atitudes: respeito pelo nosso tempo e pelo tempo da outra pessoa e a gestão da nossa ansiedade de resposta.
A prática destas atitudes, bem como a exigência de planeamento e atenção ao detalhe, são benéficas não só para a comunicação assíncrona, como para a síncrona. Uma equipa que comunica de forma clara, que antecipa momentos de trabalho e de lazer, que respeita o tempo e o ritmo de cada um e ao mesmo tempo exige o cumprimento de prazos – essa é a equipa que respeito!
Para quem procura informação sobre aprendizagem síncrona e assíncrona, recomendo este artigo Teach Thought.
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